terça-feira, 23 de setembro de 2008

até aqui.

Vivi minha vida até aqui
Até este ponto que luta
Sempre perto do mar,
Juventude nos rochedos
Corpo a corpo com o vento.
Aonde pode ir um homem
Que nada mais é senão um homem
Contando suas horas que verdejam no ábaco dos orvalhos
Contando pelas águas as visões de seu ouvido
E pelas asas seus remorsos.
Ah, vida
De um menino que se faz homem
Sempre perto do mar
Quando o sol lhe ensina
A respirar no mesmo lugar onde se apaga
A sombra de uma gaivota.
Vivi minha vida até aqui
Adição branda e total negro
Algumas árvores, alguns seixos molhados
Dedos leves para acariciar uma fronte.
A noite inteira lamentos de espera
Não há mais ninguém
Mais ninguém
Para fazer ouvir um passo de liberdade
Para fazer brotar uma voz repousada
As proas marulham contra o molhe
Traçando um nome azul no meio dos horizontes.
Alguns anos, algumas ondas
E a aproximação sensível
Das ancoragens enlaçando o amor.

Vivi minha vida até aqui
Risca amarga na areia efêmera
- Quem quer que tenha visto dois olhos afagarem o silêncio
Encontrado o calor de milhares de universos
Se lembrará de outros sóis em seu sangue
Mais perto da luz
É um sorriso que resgata a chama –
Mas aqui, nesta paisagem noviça que se perde
Num mar aberto e sem piedade
A felicidade se desnuda
Turbilhões de asas de instantes colados ao chão
Um chão duro sob a impaciência dos calcanhares
Um chão concebido para a vertigem
Vulcão extinto.

Vivi minha vida até aqui
Pedra votada ao elemento líquido
Mais distante do que as ilhas
Mais funda do que a vaga
Nas vizinhanças das âncoras
- Quando passam as carenas fendendo apaixonadamente
Um novo obstáculo que ultrapassam
E com os delfins ergue-se a esperança
Vitória do sol sobre um coração de homem –
As redes da dúvida puxam
Uma imagem de sal
Penosamente esculpida
Indiferente e branca
Que volta para o mar o vazio de seus olhos
E sustenta o infinito.

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